Furta-cor

em terça-feira, 22 de setembro de 2020

Eu caminhava livre. Já há muito não era atormentada pela psique desgovernada de alguém que ama. Seguia intacta, invicta, ilesa. Flores não esperava, romance não desejava, amarras não suportava e me parecia medíocre a ideia de querer me completar em outro alguém.


“Besteira!”, eu proclamava orgulhosa diante de tantas caricaturas clichês sobre felicidade. E foi daí, do alto de minha autossuficiência que eu caí.


Vacilei.


Não vi risco em te achar interessante, não me sobressaltaram aos olhos os sinais da perdição. Ri das tuas histórias, bebi dos teus encantos, afaguei teu pranto. Comi no prato em que cuspi.


Depois que eu te amei, não pude me rearmar. Sigo desprotegida, admiro pôr do sol, choro com finais felizes, sorrio de manhã.


Agora me diz o que fazer, se você foi e eu fiquei. Aqui. Sozinha. Desarmada. Nua. À deriva, por alguém cujo único delito foi partir, justamente quando decidi aposentar minhas botas. Agora flores me interessam, mas eu não sei pedir.


Só me resta admirar a aquarela de possibilidades que você me abriu, e se esqueceu de apagar ao partir. Antes, livre em preto e branco. Agora, prisioneira furta-cor.

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